A governadora Rosalba Ciarlini não tem interlocução com os deputados estaduais. A situação é mais grave porque falta ao chefe de Gabinete, Anselmo de Carvalho, a quem caberia prioritariamente conduzir o diálogo do Governo com os parlamentares, a autonomia necessária para as negociações com os aliados. Essa avaliação é feita pelo líder do Governo na Assembleia Legislativa, deputado Getúlio Rêgo. Ele afirma que, em uma conversa com a governadora, alertou para esses problemas. Getúlio Rêgo está na Assembleia Legislativa há quase três décadas. Foi eleito pela primeira vez em 1982 e desde então renova o mandato. Nesse período, em diversas ocasiões, foi líder de bancada. Ao alertar sobre a falta de diálogo e de autonomia dos auxiliares de Rosalba Ciarlini, Getúlio Rêgo faz a ressalva de que isso se deve às dificuldades que a governadora enfrenta desde que tomou posse. Para ele, o discurso de “herança maldita” e “terra arrasada” não se esgotou. Sem recursos para fazer a “barganha legítima”, ou seja, atender reivindicações de investimentos dos parlamentares em suas bases, a governadora estaria sem condições de manter uma interlocução com os aliados. Getúlio afirma que há perspectiva de mudança dessa situação, uma vez que as informações sinalizam que o governo começará a ter, em breve, possibilidade de investir. O deputado admite que as dificuldades impedem que se tenha resultados melhores na Saúde e na Segurança, mas afirma que em outras áreas, como na Educação, o governo demonstra avanços, uma vez que conseguiu implementar o piso dos professores. Ele destaca também que, em estados administrados pelo PT, o desempenho é pior.
O Governo recebeu crítica até de deputados aliados na Assembleia. Como o senhor vê essa reação de deputados da base aliada?
Confesso que o Governo, tendo em vista as imensas dificuldades que a administração enfrenta para resgatar o equilíbrio financeiro do Estado, tem tratado pouco do aspecto político porque está preocupado exclusivamente com a reorganização da máquina administrativa, que estava destroçada. Há um esforço gigantesco para melhorar o desempenho da administração e ampliar a receita própria. Mas a crise mundial afetou a economia brasileira e teve repercussão em todos os Estados. O Rio Grande do Norte não é uma ilha.
Mas alguns deputados têm responsabilizado a atual gestão…
Vejo a crítica dos parlamentares da oposição, na Assembleia, sobre a queda da atividade econômica do Rio Grande do Norte, que estaria abaixo dos 5 pontos percentuais. Mas comparativamente estamos ainda com desempenho bom tendo em vista que, no Rio Grande do Sul, que é um Estado governado pelo Partido dos Trabalhadores, a queda da atividade econômica passou dos 19 pontos percentuais. Toda essa situação repercute no desempenho da administração. Temos setores que têm dificuldades, reconhecemos. Há dificuldades na saúde, na segurança pública. São setores que custam caro e o Estado não tem disponibilidade financeira para investir a fim de que as respostas sejam eficazes conforme é o desejo da governadora e de todos nós. Por outro lado, a educação tem dado saltos. O governo passou agora a cumprir o piso nacional do magistério já no mês de março. Para se ter uma ideia, o Rio Grande do Sul, que é governado por um integrante do PT, que foi ministro e tem como secretária da Educação uma titular que foi presidente de sindicato, não implantou o piso nacional estabelecido por lei federal. Eu até fiz uma crítica ao Congresso neste aspecto: aprova os aumentos de piso salarial para categorias dos servidores públicos [sem apontar fontes de recursos para cobrir os custos]. Isso repercute nos estados e municípios sem uma consulta à capacidade destes entes da federação suportarem o impacto financeiro dos reajustes. Temos, nessas situações, uma quebra do princípio federativo, que fragiliza a autonomia das gestões estaduais e municipais no país todo.
O argumento da herança maldita é um discurso que a essa altura do atual governo está esgotado e não convence mais?
Acho que não. Tenho exemplos práticos de que isso (as conseqüências da “herança maldita”) é verdade. Meu filho [Leonardo Rêgo, prefeito de Pau dos Ferros] pegou uma administração destroçada no primeiro mandato, em janeiro de 2005, e passou dois anos atacado pelas medidas que adotou para sanear a administração, reequilibrar as finanças e organizar todos os setores. Apenas depois de tudo isso passou a ter condições de oferecer serviços de qualidade à população. Tenho esse exemplo dentro de minha própria família. Em 2006, houve uma eleição na qual fomos esmagados nas urnas pelo desgaste político que ele acumulou. Mas não desistiu, topou a parada, sofreu dois anos e, depois, começou a dar respostas. Então, a população começou a aplaudir. Foi reeleito em 2008, mudando o estilo tradicional da política do toma-lá-dá-cá. Com o êxito administrativo, acabou consagrado nas urnas, inclusive em 2010, quando tivemos vitórias em todos os níveis: governador, senador, deputado federal e deputado estadual. Digo isso como exemplo de que é possível enfrentar turbulências e dificuldades.
Mas essa justificativa tem um limite e “prazo de validade”?
Quando se contrai um débito grande, só é possível pagar na medida em que se tem recursos para pagar a conta. O Estado ainda enfrenta dificuldade, tem milhões de reais referentes a débitos a pagar da administração anterior. Só para aquisição de medicamentos de alto custo, o Estado ainda deve da gestão anterior R$ 52 milhões. Isso contribui para que o fornecimento de insumos necessários ao funcionamento dos hospitais da rede estadual fique prejudicado, porque as empresas que ganharam a licitação exigem receber os atrasados para voltar a fornecer normalmente. Mas o Estado não tem dinheiro para pagar o atrasado. Daí o desabastecimento. As firmas terceirizadas que prestam serviços nos hospitais públicos estão na mesma situação. Têm pagamentos a receber. O governo está finalizando o pagamento dos fornecedores do programa do leite ainda da administração anterior. Então, são tarefas que não significam mera retórica. Os problemas são reais. Eu acho que o governo deve melhorar sua comunicação para transmitir dados mais claros à população. Isso precisa melhorar.
Mas até aliados começam a fazer críticas à gestão…
Com relação à convivência com a Assembleia, temos que fazer uma autocrítica. Não está havendo diálogo com os deputados. Isso eu transmiti à governadora em uma conversa que tivemos. É preciso restabelecer o diálogo com os parlamentares, até para que eles acompanhem, no dia-a-dia, a realidade que está sendo encontrada. É preciso lembrar sempre que a tarefa de governar, a gerência, é da governadora. Mas ela precisa da participação de todos nós que somos aliados políticos. Se o governo não for bem sucedido, não seremos… Somos sócios na construção de uma vitória.
Então o governo não tem sido eficiente no relacionamento com os parlamentares?
Tem havido limitações. É uma tradição, por exemplo, a classe política barganhar. Isso, legitimamente, ao pedir benefícios para sua área de atuação política, como melhorias nas escolas, nos postos de saúde, na urbanização das cidades, nos recursos hídricos. Isso é normal. Se tal diálogo não está ocorrendo, eu suponho que a governadora, em função das dificuldades que o Estado ainda enfrenta, deve querer restabelecer essas conversas com mais assiduidade no momento em que houver condições de promover investimentos. Essa perspectiva começa a ser visualizada em um curto espaço de tempo.
Não falta designar alguém para ter essa atribuição de interlocução com os deputados e demais aliados?
Falta, falta. Não tenho nada a esconder, porque estou com 29 anos e três meses de mandato e sempre procuro transmitir a realidade de minha prática parlamentar… Sou membro do governo, mas, essa crítica, faço. Disse à governadora que é preciso o chefe do Gabinete Civil ter mais autonomia para resolver o varejo da ação administrativa. Isso não está acorrendo. Se a governadora está atribulada, com dificuldade financeira a ser superada, tem que haver alguém que seja o interlocutor do Parlamento para não sufocar cada vez mais as atividades dela. Isso deve existir e transmiti para ela pessoalmente essa percepção.
No início do atual governo estava no Gabinete Civil alguém que foi parlamentar e tem todo um trânsito com a classe política do Estado. Hoje, falta a mesma desenvoltura política no Gabinete Civil? O governo se ressente de alguém com esse perfil?
Acho que o Doutor Anselmo [Carvalho, secretário-chefe do Gabinete Civil] é uma pessoa competente e preparada. Agora falta a ele, claro, o traquejo político. Ninguém pode cobrar uma atuação desenvolta, tendo em vista que não é a praia dele. Mas sendo uma pessoa preparada e inteligente, pode assimilar. Para isso, tem que ter autonomia e estabelecer uma convivência mais próxima com a classe política. Neste aspecto, a pessoa que está colaborando muito é o presidente da Assembleia, o deputado Ricardo Motta, que é bastante ameno, muito flexível na convivência, respeita o contraditório, sabe conviver com o contrário. Ricardo Motta é um homem de diálogo e tem ajudado de forma consistente à governadora.
O senhor acha que houve a expectativa de que o ex-deputado Carlos Augusto Rosado tivesse, informalmente, esse papel?
No que se refere a Carlos Augusto, o que posso dizer, pela convivência que tenho – e não é muito próxima, porque minha área de atuação política não é Mossoró, é mais no Alto e Médio Oeste – é que se trata de um colaborador da administração, do Executivo. É um homem que tem uma experiência vitoriosa, exitosa. Carlos Augusto possui uma visão neste campo, no Executivo. A parte política… Eu estou defendendo a tese de que a governadora deve formar um conselho político. A presidente da República tem um conselho político, em um Governo que é de continuidade. Diferente da nossa governadora que sucede um adversário. Confesso inclusive que fiquei perplexo com a falta de responsabilidade do final da gestão anterior, que vendeu receitas do Estado de forma antecipada. Passou inclusive a impressão de querer inviabilizar a administração seguinte. O episódio dos últimos expedientes bancários de 2010 foi desastroso para o Estado.
Na quinta-feira foi anunciada a saída de mais um secretário. Como o senhor tem visto tantos pedidos de exoneração?
Acho que é uma coisa natural. Se, quando a governadora tomou posse, o Estado estivesse em uma situação equilibrada, com capacidade de investimento, essas mudanças não seriam tão frequentes. A tarefa de administrar na escassez de recursos é algo que nem todo mundo topa. Enfrentar turbulência, subir ladeira pedregosa, é para quem tem atitude firme de contribuir com o serviço público. Não é só na bonança que se deve participar. É necessário ter consciência de que a função pública exige sacrifícios para enfrentar desafios e superar obstáculos.
Está faltando essa determinação a aliados e auxiliares?
Eu sou paciente. Tenho uma militância política de décadas. Compreendo as dificuldades pelas quais a governadora está passando e quero ser seu aliado neste contexto. Exerço a liderança do governo e não fiz indicação para nenhum cargo na administração central do Estado. Zero. Mas estou compreendendo que este momento poderá chegar. Para isso sou parceiro da governadora no enfrentamento da missão espinhosa de reorganizar o Estado.
O afastamento do vice-governador dificultou ainda mais?
O afastamento do vice-governador Robinson Faria é uma coisa que nós lamentos. Foi uma perda que todos nós sentimos. Mas ele se afastou por iniciativa própria. Não foi feliz na decisão que tomou. Fez isso à revelia até dos aliados mais próximos. Veja que havia o anúncio de que ele iria para um partido, o PSD, e teria a maior bancada na Assembleia. Terminou ficando com dois [parlamentares]. Desses dois, tem um que está colaborando com a administração estadual do ponto de vista de apoio, que é a deputada Gesane Marinho. Enquanto o deputado José Dias, que é um parlamentar de muita experiência e muito conceito, também tem colaborado, apesar de ter assumido uma posição mais crítica, que nós respeitamos, pela postura que o partido dele adotou. Agora em relação a Robinson Faria, ele era aliado até pouco tempo, e compreendia as dificuldades do governo do qual era parceiro expressivo, com participação no bolo administrativo do Estado. A saída dele foi, portanto, um ato unilateral, que respeitamos e só podemos lamentar.
Apesar de sua base eleitoral ser mais no Alto e Médio Oeste, como tem acompanhado as articulações para definição de como o DEM vai se posicionar nas eleições deste ano em Natal?
Não abrimos este debate no âmbito da Executiva Estadual do partido. As manifestações, por enquanto, são por intermédio da imprensa. É evidente, pelo que estou visualizando, que há no bloco de sustentação do governo – que hoje conta com a presença importante do PMDB através do deputado Henrique Eduardo Alves e até deputados estaduais que não votaram na governadora Rosalba Ciarlini – mais de um pretendente como candidato a prefeito de Natal: o deputado estadual Hermano Morais (PMDB) e o deputado federal Rogério Marinho (PSDB). Rogério Marinho votou, em 2010, integralmente com a nossa aliança. Hermano, que é um companheiro de Assembleia com desempenho bastante satisfatório, é pré-candidato declarado do PMDB. Nesse aspecto, penso que Rogério Marinho leva vantagem, porque ele votou integralmente com nossa aliança, participou de nossa luta nas eleições, enquanto Hermano, na época do processo eleitoral, seguiu a orientação de Henrique Eduardo Alves.
Como o senhor vai se posicionar se for consultado sobre esse assunto?
Se esse assunto for ao debate, vou reconhecer que, como a eleição acontece em dois turnos, é legitimo que os dois sejam candidatos. Acho apenas que nosso partido [o DEM], e esse é um pensamento meu sem conversar nada oficialmente, deverá apoiar, no primeiro turno, Rogério Marinho. Mas isso facilita a convergência no segundo turno. Se for Hermano o candidato no segundo turno, naturalmente vamos desaguar em uma aliança favorável à candidatura dele. Se for Rogério Marinho, esperamos que o PMDB tenha a mesma postura. Isso sem prejuízo da aliança. Temos convivido com as melhores experiência. Recebemos o apoio do ministro Garibaldi e o deputado Henrique. Eles têm ajudado ao governo com muita cordialidade e atenção. Todos os nossos deputados do PMDB na Assembleia também são aliados. Se for possível fazer uma conjugação e uma candidatura já no primeiro turno, melhor ainda. Mas compreendo que nem sempre isso é possível. Veja o caso da oposição, que tem as candidatura de Fernando Mineiro, do PT; de Carlos Eduardo, do PDT; e estão anunciando que Wilma, do PSB, também é candidata. Se a oposição tem três candidatos, porque os partidos que estão na base do governo não podem ter dois?
Mas acha que, se houver mesmo mais de um candidato na base do governo, a governadora deve participar da campanha em Natal já no primeiro turno apoiando um dos nomes?
Aí você vai entender que eu não poderia responder sobre isso. Só ela pode afirmar alguma coisa a esse respeito.
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